A Rússia realizou uma jogada de mestre.
O acordo de paz apresentado pela diplomacia russa para evitar o ataque
norte-americano à Síria colocou Obama na defensiva. A população norte-americana
não deseja a guerra, pelo alto custo financeiro e em vidas humanas de um
conflito que pode ser ainda mais longo, custoso e imprevisível do que a invasão
do Afeganistão e do Iraque, e certamente os parlamentares do Congresso
norte-americano, que em breve voltarão a concorrer nas eleições, não podem
ficar totalmente insensíveis aos desejos de seus eleitores. Obama encontra-se
sob dupla pressão: de um lado, os sionistas e empresários das grandes
corporações instigam o ataque militar a Damasco, de outro, sofre a pressão da
opinião pública nos Estados Unidos e da Europa contra a guerra. O acordo
proposto pela Rússia – e aceito pelo governo sírio – oferece à administração
americana uma “saída honrosa” para cancelar – ou pelo menos adiar – a nova
agressão imperialista. Para o país árabe, o acordo é vantajoso porque oferece a
Bashar Al-Assad mais tempo para vencer a
guerra contra os mercenários, sem privar-se do que há de mais avançado e eficaz
em seus meios de defesa – mísseis de todos os tipos, canhões, caças e tanques
de alta tecnologia fornecidos pela Rússia. As armas químicas não são eficazes
numa guerra convencional; podem causar pânico e terror psicológico em
populações civis e deixar sequelas físicas por várias gerações, como acontece
ainda hoje no Vietnã, bombardeado com napalm e agente laranja pelos EUA, mas
não são armas que garantem o resultado de um conflito (o arsenal nuclear de
Israel é infinitamente mais poderoso do que qualquer arsenal químico). Por outro lado, ao entregar suas armas
químicas, a Síria afasta a imagem de “intransigência” associada a ela mídia
internacional, mostra à opinião pública que tem boa vontade, quer dialogar e
chegar a uma paz duradoura, aceitando inclusive o monitoramento da ONU, em
contraste com o discurso agressivo e militarista da administração Bush. Ao
entregar as armas químicas, Assad pode provar que não foi o autor do recente
ataque realizado nas imediações de Damasco, uma vez que o tipo de gás empregado
é diferente do que está disponível nos arsenais sírios, derrubando o principal
argumento apresentado por Obama para iniciar a nova guerra de rapina. Claro: nada disso impede que os Estados
Unidos, a Turquia ou Israel ataquem a Síria em curto ou médio prazo, mas essa
possibilidade fica mais distante, por várias razões: 1) os Estados Unidos não
querem arcar sozinhos com essa responsabilidade, pelo alto custo financeiro de
uma guerra regional, que fatalmente contará com a participação do Irã e do
Hezbollah ao lado da Síria; 2) a Inglaterra recusou participar da intervenção
militar ao lado dos Estados Unidos e na França e Alemanha há forte oposição
popular; 3) a presença de frotas navais da China e da Rússia nas proximidades
da Síria são peças simbólicas do jogo de xadrez político, mas podem,
hipoteticamente, ser mais do que isso; 4) o risco de uma guerra regional se
alastrar por Israel e Turquia torna as conseqüências do conflito completamente
imprevisíveis. Um ataque cirúrgico dos EUA contra instalações industriais e
militares sírias pode ser o início de uma III Guerra Mundial. Por todas essas
razões, não é tão fácil para os Estados Unidos desencadearem, sozinhos, uma
guerra contra a Síria.
Caso o acordo proposto pela Rússia se
concretize, o primeiro significado político desta iniciativa será a derrota dos
Estados Unidos em seu objetivo de depor o governo Assad (e vale a pena
acrescentar aqui a incapacidade dos mercenários de derrotarem sozinhos o
Exército Árabe Sírio e o forte apoio da população síria ao seu presidente e às
Forças Armadas). O segundo significado político é a ascensão da Rússia e da
China como mediadoras do conflito, disputando protagonismo com os
norte-americanos na resolução das questões internacionais, o que altera a
correlação de forças no planeta e pode ter novos desdobramentos, com a eventual
ação conjunta dos BRICs (e cabe aqui cobrarmos do Brasil que assuma posição
mais clara contra qualquer intervenção militar estrangeira na Síria e o
respeito à soberania do país árabe).
A solidariedade internacional ao povo da
Síria é essencial para isolarmos ainda mais os falcões da Casa Branca e do
Pentágono e contribuirmos para a defesa da soberania da Síria. Uma ação
decisiva nesse sentido é a organização de grandes atos populares contra a
ameaça imperialista, com a participação ativa dos partidos de esquerda, sindicatos,
entidades de mulheres e da juventude, como os realizados no início de setembro
em sete capitais brasileiras – São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba,
Florianópolis, Salvador, Fortaleza e Distrito Federal. Está em discussão a
organização de um Dia Nacional de Solidariedade ao Povo Sírio e a viagem de uma
missão brasileira de solidariedade a Damasco, com representantes de partidos
políticos e de entidades da sociedade civil.
Abaixo a agressão imperialista!
Vitória, Bashar!
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